Verão caloroso e vendaval de problemas para um presidente argentino que desaba

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Por Rubén Armendáriz

Verão deste ano na Argentina vem sendo marcado pelo sol forte e por um vendaval de problemas, entre eles a superpopulação de familiares de funcionários macristas no aparato estatal, os aumentos de tarifas de serviços básicos em fevereiro para complicar a visa do pobre cidadão, a decisão dos trabalhadores de ir às ruas contra tudo isso, criando sérios conflitos com os dirigentes sindicais, além da consolidação dos investimentos chineses no país.

As pesquisas concordam em que a maioria dos argentinos (seis de cada dez) afirma que não chegará bem ao fim de mês, ou está com o orçamento apertado, e que acham que o governo não tem soluções para vencer a inflação, a pobreza e os problemas dos aposentados. Aumenta na população a desconfiança com respeito às promessas e a certeza de que o aumento do dólar vai influir nos preços.

Na última semana, houve uma reunião que gerou muitas expectativas, mas que foi invisibilizada pela imprensa hegemônica, e que contou com a presença de Xiao Jie, ministro da Fazenda de China. Os temas foram: a reunião do G-20, em novembro, e os planos de investimentos chineses na infraestrutura argentina.

Os chineses querem um corredor bi oceânico e para isso se está planificando o Túnel de Água Negra, que vinculará a Argentina com o Chile, além das obras, já em andamento, das duas represas na província de Santa Cruz (no sul do país), da estação espacial em Neuquén (que já está terminada e em período de provas), do projeto de duas centrais nucleares de 15 bilhões de dólares e dos planos de infraestrutura ferroviária.

A questão da superpopulação de familiares diretos de altos funcionários nos cargos públicos ganhou repercussão nestes últimos dias e Mauricio Macri se viu obrigado a pedir a renúncia de muitos deles no final de janeiro. O governo encontrou nesse tema a possibilidade de gerar manchetes que não fossem tão negativas, mas…

O presidente pensa, na verdade, em acabar com 4 mil cargos políticos, o que levaria a economizar mais de 2 bilhões de pesos (100 milhões de dólares). Os economistas de direita se burlam dessa medida, que só significa apenas 0,3% do déficit orçamentário. A cifra ganha ainda mais ar de deboche se comparada com os 100 bilhões de pesos (5 bilhões de dólares) que o governo acumulou através da recentemente aprovada reforma previdenciária.

Obviamente, o corte de empregos não afeta os poderes Legislativo e Judiciário, tampouco os governos das províncias e municípios: essas gambiarras sempre deixam vazios que são aproveitados para que os que foram cortados agora sejam reaproveitados amanhã em outro lugar.

Já se foi o primeiro mês deste 2018, com o novo ajuste a todo vapor. Durante os 11 meses que restam, o governo pretende cozinhar as perspectivas para o ano eleitoral que se seguirá. A situação do país em dezembro indicará as possibilidades do macrismo, seja com uma reeleição do atual mandatário ou, caso haja uma situação mais complicada, a aposta em manter o poder com a candidatura presidencial da atual governadora da Província de Buenos Aires, María Eugenia Vidal. Contudo, no momento, ambas as figuras vão caindo nas pesquisas.

Em janeiro, as sondagens que orientam o governo mostraram que a popularidade de Macri está não só abaixo da de Vidal como também da do prefeito da Capital, o também aliado Horacio Rodríguez Larreta – quem disse, em entrevista ao diário La Nación, que ele e Vidal buscarão somente revalidar seus cargos em 2019, e que o candidato presidencial será Macri.

Ao analisar a situação do país pode-se constatar que as condições para saber se a oposição, encabeçada pelo peronismo, tem ou não condições para brigar pela presidência, depende de dois fatores. O primeiro é que o macrismo continue caindo nas pesquisas, que não possa cumprir o plano compensar agora os custos de suas medidas e criar as condições para reverter em 2019 os efeitos negativos que está causando agora. O outro fator é que o próprio peronismo seja capaz de estabelecer internamente a unidade necessária para derrotar a coalizão governista.

Da sua cadeira de senadora, Cristina Kirchner vai consolidando novamente sua figura, mas mesmo ela tem dificuldades para se impor como candidata unitária do setor.

Em matéria econômica, o governo publicita algumas cifras positivas, como em termos de crescimento, emprego e consumo de alguns setores, mas a teimosa realidade social mostra outra cara, com aumentos nos preços do transporte, da luz, dos combustíveis e das mensalidades do serviço de saúde. Enquanto isso, os produtores rurais reclamam que a política econômica visa apagar do mapa as economias regionais.

Jeffrey Sachs, o acadêmico da Universidade de Columbia que participou das atividades preparatórias da reunião do G20 – que a Argentina organizará em novembro deste ano –, deixou um par de mensagens que deixou atônitos os funcionários do Ministério de Relações Exteriores argentino: criticou a política chamada de “Vaca Morta” (produção de petróleo e gás por fracking, devido ao seu impacto ambiental) e também a decisão de reduzir os impostos das grandes empresas, o que faz aumentar a desigualdade, que já é insustentável.

“Para que o convidamos?”, se perguntou um alto funcionário da diplomacia. Com amigos assim, não é preciso ter inimigos.

Rubén Armendáriz é jornalista e cientista político uruguaio, analista do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)

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