Venezuela: Duelo pela morte do realismo mágico (em ano eleitoral)

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Por Álvaro Verzi Rangel
O 2017 na Venezuela transcorreu entre protestos, tentativas de derrubar o governo entre abril e julho, eleições regionais e municipais, criação da Assembleia Nacional Constituinte, que cavalgaram sobre a deterioração das condições de vida da população, afetada pelo alto custo de vida e a escassez de produtos básicos, alimentos e remédios.
Este 2018 começa, com alguns protestos por falta de abastecimento e transporte, com a expectativa de que estes problemas tenham solução através de um acordo de convivência – de curto, médio e longo prazo – que se negocia entre governo e oposição em Santo Domingo diante dos imperativos sociais, econômicos e políticos.
O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o diplomata uruguaio Luis Almagro, talvez com a intenção de bombardear o diálogo entre governo e oposição, se pronunciou recentemente a favor de sanções adicionais contra funcionários e o aparato financeiro venezuelanos, para que obriguem o presidente Nicolás Maduro a realizar “eleições imparciais”. “O caminho diplomático que resta é o das sanções e das negociações sérias para a redemocratização. Deve haver sanções cada vez mais duras, que permitam estruturar um processo eleitoral claro”, declarou.
Além de congelar bens nos Estados Unidos e suspender vistos a dezenas de funcionários, o governo do presidente Donald Trump proibiu as empresas estadunidenses de conceder novos empréstimos à Venezuela, por considerar que o governo de Caracas violou os direitos humanos durante os protestos opositores de 2017, que deixaram 121 mortos. O dirigente opositor Henry Ramos Allup, admitiu que nenhuma destas pessoas era filho de dirigentes políticos, como se difundiu internacionalmente.

O relativo equilíbrio na correlação de forças – independente do desmembramento de uma oposição que agora tenta encontrar um candidato unitário, e talvez o empresário Lorenzo Mendoza seja o nome de consenso – torna imprescindível que as eleições presidenciais, que se realizarão em alguma data ainda este ano (sabe-se lá quando exatamente), tenham como base um acordo de coexistência, que se mantenha seja lá quem ganhe nas urnas.

O mal-estar social pelo desabastecimento e a altíssima inflação tem seus sólidos cimentos nos problemas da economia, que se expressam na queda da produção nacional (industrial, agrícola e sobretudo petroleira), resultado da ineficiência e da corrupção na gestão específica da indústria petroleira, das políticas macroeconômicas e do bloqueio financeiro externo.

Se fala muito de socialismo, mas na verdade a economia venezuelana continua sendo guiada pela ditadura do capitalismo, que controla a maior parte da produção das mercadorias de uso diário, das cadeias de distribuição e dos preços. Além do grande capital, também o pequeno capital aparece como participante, pois possui a imensa maioria dos locais comerciais.

A dívida externa, sua reestruturação e o levantamento do bloqueio financeiro, um novo esquema cambiário que permita que ao sector privado utilizar suas divisas para as importações. Todos esses são pontos de urgência, em torno dos quais se faz necessário um entendimento.

É verdade que durante 2017 o diálogo não chegou a acordos, como se esperava. Há outro caminho? As medidas macroeconômicas anunciadas não foram implementadas.

Persiste na Venezuela o modelo de (in)comunicação das medidas e da explicação dos fenômenos que se enfrentam: o bloqueio alimentício imposto pelos Estados Unidos e países aliados a este foi reforçado, algo que merecia um alerta à população não por parte do presidente e sim das autoridades responsáveis.

Há, sem dúvidas, um utilização política do problema e uma superexposição de Nicolás Maduro, que ainda não possui o carisma e está muito longe da sintonia com o povo que tinha Hugo Chávez.

Elías Jaua, ministro da Educação e membro da direção política governista, admite que a agressividade dos setores médios da sociedade está ligada diretamente à complexa situação económica. Se trata, segundo ele, de uma classe média que conseguiu expandir seus direitos na primeira década desta Revolução, que teve coisas que nunca havia obtido antes, nem mesmo nos Anos 70, mas que nem assim deixou de ser

ideologicamente contrário ao governo, e que agora se alia a uma oposição devido às condições materiais.
“Creio que há um primeiro passo a ser dado: a recuperação econômica, a contenção dessa ira expressada por grandes setores das classes médias, inclusive com alguma expressão nas chamadas classes médias populares, tem a ver com um processo de estabilidade da economia, para a qual também é preciso estabilidade política e paz em todo o país, e nós demos um passo importante ao garantir a paz, a estabilidade, ao conseguir o retorno dos partidos da oposição ao jogo político eleitoral”, comenta Jaua.

Com 2018 já em marcha, o ambiente político, de maneira mais ou menos uniforme, passou a viver o duelo da morte do realismo mágico que o país vinha vivendo.

Álvaro Verzi Ranger é sociólogo venezuelano e codiretor do Observatório de Comunicação e Democracia

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